Lembrança sólida

Uma ilha. Fim de férias. Malas espalhadas. Ônibus na porta do hotel e dezenas de pessoas em movimento, check-out, arrumações e despedidas... Haianna conferia suas malas, se estavam todas ali. Poderia perder o horário, sua mente estava cheia, queria lembrar se não tinha esquecido nada... De repente, seu pensamento é interrompido, por Samir, um menino alvo, lábios corados, olhos redondos. Estava com um sorriso maroto, bem característico seu, mas agora parecia ser de quem escondia algo, um de seus braços estavam para trás.
Estava distraída, mas sentiu vontade de se concentrar nele. Haianna conseguiu se desprender da dinâmica do momento, e olhou para mão estendida à sua frente. Sua testa franziu numa tentativa de decifrar aquilo. Era verde, parecia uma semente grande. Era um mini coco, menor que o dorso de uma mão. Ficou na dúvida da finalidade daquilo, mas, sensível à atitude e expectativa dele, ela pegou, sorriu, e demonstrou afeição pelo coquinho... Samir disse que era pra guardar como lembrança... Ela achou diferente, então, veio à sua mente o seu fascínio por plantas, bichos, eco e afins... Sorriu pra si mesma e percebeu que era importante pra ele, então decidiu que seria pra ela também.
Depois de dias... Lá estava ela em seu quarto, queria um lugar para o querido coquinho... Afinal, não poderia se desfazer... Era a lembrança. Arrumou um espaço no cantinho da gaveta de quinquilharias da cômoda. Não era o local mais nobre, mas ali estaria seguro e não perderia facilmente. O tempo passou e ele já não estava mais verde, foi diminuindo e não tinha nenhuma beleza, estava marrom, seco e sem vida. Jogou-o fora. Lamentou pelo destino da lembrança. Mas fazer o quê, se era tão frágil... Pensou que assim também seria o desfecho daquela história.
Engano. O curso dos humanos é diferente dos da natureza. Envolve escolhas, sentimentos, vontades e empatias... Depois de alguns meses em um e-mail, a resposta, outro e-mail e assim sucessivamente... Até um dia chegar às mensagens instantâneas e longas conversas por janelinhas...
Samir era daqueles que come quieto, característico de sua terra. Do tipo que aos poucos conquista espaço e não se substitui facilmente. Misterioso, desconfiado e doce. Complexo. Cheio de idéias e pensamentos que pareciam não conter em si. Irônico e sarcástico conseguia ser gentil e ensinável, ao mesmo tempo. Às vezes parecia tonto. Ilusão. Devido sua inteligência perceptível e esperteza, se fazia de tal.
Um ano passou. Companhia, conselhos, risadas... Dois anos, cotidiano, problemas... Três anos... Eles estavam diferentes, mais maduros, experiências, decepções... Quatro anos e entre idas e vindas, brigas, longos períodos de silêncio... O tempo os fez aprender um com o outro e nem se deram conta disso.
Lembra história de romance... Mas que nada. Cada um teve e tem seus amores. O que tiveram foi maior. Um compartilhar de prazeres e dissabores... Algo que, incrivelmente, transpôs a distância, espaço, razão e todos os fatores que não conseguiram separar esses corações. Que, ao contrário do coquinho, cresceu, ganhou forma, beleza e desenvolveu uma atividade interna significativa e peculiar dos seres humanos... Uma amizade.

Comentários

  1. Caraca, desculpe vir aqui de intrujo, pois vi esse lugar no blog de um amigo.... gostei muito disso aqui, essas palavras, saem da tela e vem direto ao meu ser, obrigado, estaja você perto ou longe, suas palavras ecoam em minha alma...

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  2. Demorei mais cheguei, hehehe. Muito boa essa, crônica, achei muito boa mesmo, me emocionou bastante. Que história bacana, aposto que esse camarada nem lembra desse tal coco, mas se ele ler isso com certeza ele vai ficar muito feliz, iria fazer uma diferença muito grande na vida dele, ele ia ficar se sentindo o cara mais querido do mundo. Parabéns pelo texto, muito bom mesmo.

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  3. Que lindu texto amiga!!!
    Ta de parabens, vc escreve mto bem!! =D
    saudade...

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